Os dados obtidos com a medição das supernovas indicam que, nos últimos 5 bilhões de anos, o Universo se expandiu tão rapidamente que duplicou de tamanho
(Victor Alencar - O Povo) Quando olhamos para o céu, vemos os mais diversos corpos celestes e eles estão a diferentes distâncias de nós. Sabemos que a luz desses corpos demora um tempo para serem captadas pelos nossos olhos. É como se tivéssemos olhando para um álbum de fotografias com fotos de datas diferentes. Com o passar do tempo, as fotos vão ficando mais velhas. Até aí, tudo normal, mas o que o trabalho ganhador do Prêmio Nobel de Física de 2011 vem nos dizer é que essas fotos estão ficando velhas bem mais rápido do que imaginamos.
Os premiados cientistas norte-americanos Saul Perlmutter, Adam Riess e Brian Schmidt pesquisaram como estava a expansão do Universo. Desde Edwin Hubble, sabemos que o universo está em expansão, mas acreditávamos que essa expansão estava desacelerando e foi à procura de provas para essa desaceleração em pesquisa com supernovas (fase de explosão de estrelas massivas) distantes que esses astrônomos descobriram exatamente o contrário, que o Universo está em expansão acelerada.
Os dados obtidos com a medição das supernovas indicam que, nos últimos 5 bilhões de anos, o Universo se expandiu tão rapidamente que duplicou de tamanho. Em conversa com o astrônomo, professor da Unirio, vice-coordenador da Olimpíada Brasileira de Astronomia e amigo Jaime Fernando Villas da Rocha nos explica um pouco mais sobre a pesquisa ganhadora do Nobel.
1 Já era de conhecimento que o universo estava em expansão desde as descobertas de Hubble. Qual é a importância dessa pesquisa sobre expansão do universo?
Jaime Fernando Villas da Rocha: O trabalho de Hubble é fundador: a distância entre as maiores estruturas do Universo está a crescer! Mas o Nobel deste ano premia o “como” o Universo se expande: mais rapidamente hoje do que no passado. Isso significa que a expansão está afetando escalas cada vez menores com o passar do tempo. E que nem sempre foi assim. A taxa atual nos diz que, a cada segundo, distâncias da ordem dos três milhões de anos-luz (30 trilhões de quilômetros) se tornam 1 quilômetro maiores. Um universo em expansão acelerada significa que esta taxa está a crescer. Num futuro finito, mas distante (20 e poucos bilhões de anos), a taxa será inumeráveis quilômetros por distâncias inimaginavelmente pequenas. Ou nenhuma distância...
2 Uma das grandes incógnitas da Cosmologia atual é a energia escura. Como ela afeta a expansão do universo?
Jaime: Energia escura seria um dos possíveis constituintes do Universo responsável pela expansão acelerada. Usamos a Relatividade Geral de Einstein para descrever o universo. No quadro desta teoria, foi imposta uma regra de bom senso: tudo influencia na gravitação, mas no balanço final as coisas se atraem. Isso implica que ele deveria estar se expandindo a taxas cada vez menores. É exatamente o contrário que foi observado agora, que ele se expande cada vez mais rapidamente. O que estaria a causar isto? Ou a existência de fato de uma força repulsiva associada à constante cosmológica que Einstein pensou para manter o universo globalmente equilibrado à qual ele mesmo renunciou quando Hubble descobriu a expansão em si ou que a maior parte do que constitui o Universo é algo repulsivo (literalmente: não atrativo). Isso seria energia escura.
3 Como foi feita essa medição através da supernova para determinar os resultados dessa pesquisa?
Jaime: Antes de mais nada: do ponto de vista observacional, supernovas não são astros, são eventos. Esta pesquisa está baseada numa classe especial de supernovas, as designadas como 1-A. São eventos explosivos entre pares de estrelas (estrelas binárias). Uma delas já havia morrido e se tornado um cadáver estelar de pequena massa, uma anã branca que está a capturar a massa da atmosfera expandida da companheira e existe um limite de massa no qual a anã branca explode. Então, todas as supernovas tipo 1-A explodem com a mesma massa. Todas produzem o mesmo brilho. Se sabemos o quanto elas brilham exatamente, podemos, pelo brilho que vemos, dizer a que distância estavam. Então, podemos fazer um mapa entre distância absoluta e velocidade de afastamento. E então, comparar velocidades de diferentes épocas e concluir que a taxa de expansão de épocas passadas é menor do que a taxa de expansão atual.
4 Como você enxerga os avanços da Cosmologia para a ciência atual?
Jaime: Soubemos transformar a Cosmologia no grande laboratório de nossas mais delirantes ou comedidas teorias. Já não é possível - ou lícito! - pensar nossas duas maiores contribuições de edifícios de conhecimento construído, a Mecânica Quântica e a Relatividade Geral, sem suas aplicações - testando-as no cenário do Universo como um todo. O que é a energia escura não cabe no nosso modelo de matéria que é confirmado pela Cosmologia! Se a aceleração for produzida pela Constante Cosmológica, então, a única ligação possível é com a energia do vácuo e o resultado é um erro de, aproximadamente, um número com 123 zeros!. O maior erro da ciência até hoje! Instigante. Ótimo!
5 Algum comentário a mais?
Jaime: O desafio imposto, por essas descobertas, ao que já construímos de conhecimento, se por um lado nos instiga a fazer mais, construir mais, nos lembra permanentemente que devemos ser humildes com o que já julgamos “conhecer”. Conhecimento é nossa interpretação do mundo fundada nos dados que conseguimos coletar. Nenhuma teoria é “a” verdade; nem por isso é desprezível: são degraus de uma escada que nunca estará terminada Sempre teremos novas interrogações construídas a partir do conhecimento que já articulamos e que, por isso mesmo, nos abre a possibilidade destas novas interrogações, de novas construções.
Tudo o que vemos, pegamos, sentimos, desde as bactérias e moléculas de ar até as maiores galáxias somadas são apenas cerca de 5% de todo o Universo. Os outros 95% são constituídos de Matéria Escura e Energia Escura: duas entidades que são os grandes mistérios dos cientistas. Vendo essa proporção, podemos ter certeza que ainda haverá muitos prêmios Nobel de Física para as futuras explicações do Cosmos.
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